20.12.05

O debate impossível

Hoje vamos assistir a um debate que nunca deveria existir, pelo menos, nos moldes em que ele vai acontecer e decidindo (se é que ainda há algo a decidir) o que pode decidir.
O debate entre Cavaco Silva e Mário Soares deveria ser para sempre algo que apenas povoaria o nosso imaginário. O confronto entre estes dois pesos pesados da democracia portuguesa nunca deveria ter descido ao concreto, tornar-se real e tangível. Somente deveria pairar nos pensamentos e desejos daqueles que mais vibram e se emocionam com a discussão política.
O confronto entre as duas personagens que mais marcaram a vida de Portugal no pós 25 de Abril deveria continuar um mito, um mito inatingível e impossível.
Mas Mário Soares não quis que isso acontecesse. Do alto da sua arrogância de patriarca e chefe da nação a quem tudo é possível e a quem todos devem reverência, o ex-presidente decidiu enveredar pela mais imprevista e impensável das batalhas, tudo para tentar evitar a suprema provocação de ver o seu arqui-inimigo atingir o lugar que já foi seu e que ele julga e quer que seja dele para sempre.
E como em todos os mitos, a realidade mostrou-se bem mais dura, menos aliciante e imponente do que todos esperavam. Surpreendido pela reacção negativa do povo português, Mário Soares não conseguiu vestir a pele de candidato, continuando a julgar que a impunidade com que se move no seu círculo de amigos tem obrigatória correspondência no resto do país. O confronto entre ambos, por exclusiva culpa de Soares, tem-se traduzido apenas em ressentimento, ataque pessoal e despeito, nada sobrando da esperada grandiosidade condizente com o passado e prestígio dos dois.
E é isso que devemos esperar no debate de hoje à noite. Desesperado pelas sondagens e pela reacção da grande maioria da população, devemos esperar o pior de Soares, ou seja, o mesmo que tem sido mostrado e demonstrado nos comícios e jantares de campanha, uma mistura de rancor com o ódio pessoal, de incompreensão com arrogância intelectual, de orgulho perdido com insolência.          

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