23.1.07

Os interesses da criança

Um dos argumentos que mais se tem utilizado para defender Luís Gomes, no processo que o condenou a seis anos de prisão, é que aquele sempre actuou pensando nos superiores interesses da criança, ou seja, sempre pensando primeiro no bem-estar da Esmeralda (ou Ana Filipa).
No entanto, e analisando o acórdão e a matéria de facto provada, nunca é essa a ideia que transparece.
A verdade é que tanto Luís Gomes como a sua esposa sempre se recusaram, liminarmente e há mais de dois anos, a entregar a Esmeralda ao seu pai biológico, Baltazar, pese embora haver uma sentença que os obriga a isso. E essa recusa sempre foi absoluta, nunca havendo da sua parte, sequer, uma tentativa ou gesto conciliador que pudesse concertar minimamente os seus interesses com os de Baltazar. Ou seja, nunca os aspirantes a pais adoptivos pensaram que, caso a decisão acabasse por ser mesmo definitiva, seria muito melhor para a criança, ainda que gradualmente, começar a conhecer o seu pai, havendo contactos entre ambos, do que andar foragida durante tempos indefinidos, de povoação em povoação, sem nunca conseguir estabelecer verdadeiras raízes, para no final acabar por lhe ser entregue.
Ao ler-se todos os factos que levaram à decisão, o que vem ao de cima é, única e simplesmente, a vontade intransigente e férrea de Luís Gomes e da sua mulher em ter na sua posse e ao seu cuidado a Esmeralda (ou Ana Filipa), sendo esse o principal interesse que os parece mover e que os leva a infringir todo o tipo de preceitos legais e ordens dos tribunais.
Teoria que ganha ainda mais força se pensarmos que, tal como bem referiu o acórdão, o tempo parece jogar a seu favor, já que quanto mais tempo a criança estiver sob a sua guarda, mais argumentos surgirão contra a sua retirada do ambiente em que cresceu. Aliás, isso mesmo pode ser constatado nas inflamadas reacções da opinião pública.
E, se é traumático para uma criança ver-se afastada do ambiente em que foi criada durante dois anos, também é igualmente traumático para a mesma criança saber que tem um pai que a perfilhou, mas que sempre foi impedido de a ver e de a contactar, apesar de haver uma decisão judicial em contrário, sendo essa a razão pela qual, durante anos, não teve nem casa nem pouso certo.

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