21.12.04

A doença do País

Finalmente, parece que há uma unanimidade nos partidos políticos em relação à necessidade de medidas rigorosas para controlar o défice das contas públicas. Só assim podemos entender as declarações que os vários dirigentes fizeram hoje a propósito do "chumbo" do Eurostat à manobra financeira que o Governo pretendia executar cedendo o direito de propriedade de alguns imóveis do Estado por um período limitado. É interessante notar que as personalidades que sempre criticaram a "obsessão pelo défice" e que acusavam o Governo de hipotecar o futuro do País só para agradar à União Europeia venham agora insurgir-se contra o "descontrolo do défice" e o estado caótico das contas públicas.
Quanto a mim, considero que o descontrolo orçamental deve ser combatido com todo o rigor e é certo que os esforços do actual e anterior Governo para controlar o défice público parecem não ter sido suficientes. Mas pergunto-me se seriam possíveis, no contexto político e social dos últimos meses, algumas medidas necessárias para baixar a despesa e aumentar a receita. É que as verdadeiras soluções para este problema são profundamente impopulares. Implicariam despedir pessoal da Função Pública e aumentar a produtividade dos funcionários, o que traria milhares de pessoas para as ruas em protesto; acabar com a evasão fiscal das pequenas e médias empresas, o que significaria um tumulto social de muitos comerciantes e empresários que passam a vida a queixar-se dos fracos rendimentos; o encerramento das empresas parasitas que sobrevivem apenas por concorrência desleal e se baseiam na mão de obra desqualificada, o que engrossaria a fila de desempregados de meia idade e sem perspectivas de outro emprego; uma reorganização profunda nos serviços de Saúde e não apenas pequenos ajustes que, mesmo assim, já conseguiram assanhar as corporações profissionais.
A política não pode ser simplesmente a aplicação directa das medidas consideradas correctas pelos académicos. É fácil enumerar essas medidas numa conferência ou escrevê-las num livro. Difícil é aplicá-las mantendo a coesão social do País. As reformas que no papel demoram 2 ou 3 anos a implementar precisarão do dobro do tempo para passar à prática. O país precisa de medidas urgentes mas, tal como o doente moribundo, não aguenta manobras muito invasivas. Assim, não vislumbro para os próximos tempos qualquer solução eficaz que trate as verdadeiras causas dos problemas.

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