As repercussões da doença nos médicos (Parte II)
Há umas semanas atrás, referi-me aos processos mentais desencadeados instintivamente pelo profissional de saúde quando tem que lidar com pessoas
Uma outra situação ocorre quando é o próprio médico a ter uma doença grave: o médico e o doente são a mesma pessoa e o caso adquire contornos ainda mais dramáticos e irónicos quando o médico se torna vítima de uma doença que por ele foi combatida ao longo da sua vida. De facto, durante a sua carreira profissional, o médico vai estudando e conhecendo ao pormenor algumas doenças (de acordo com a sua especialidade) e vai adquirindo um controlo progressivo sobre os processos patológicos de modo a que, mesmo não sendo possível a cura, possa atrasar a progressão da doença e eliminar os sintomas mais incómodos. Muitas vezes usando os mecanismos de defesa atrás descritos, a doença transforma-se numa entidade que ele manipula no seu dia-a-dia. É, portanto, fácil de compreender que a descoberta de um sinal da doença em si mesmo se revele chocante e que conduza, não raras vezes, a um processo de negação. O médico tenta, deste modo, adiar o inevitável, ignora durante algum tempo as evidências e atrasa, por vezes irremediavelmente, o pedido de ajuda. O desempenho do papel de doente é difícil para grande parte da população comum mas no caso do médico acometido por uma doença é ainda mais problemático. Com efeito, o assumir da doença, o desejo e a disponibilidade de ser submetido a procedimentos de diagnóstico e de tratamento exige uma reformulação radical dos comportamentos de um indivíduo que se vê atacado pelo mal que aprendeu a combater nos outros.
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